Novas meditações para o Rosário e a Ladainha de Nossa Senhora
Pe. R. Th. Calmel O.P.
ENCARNAÇÃO E VIDA OCULTA EM NAZARÉ.
I. Anunciação. Cremos com toda a Igreja que Maria permaneceu sempre Virgem, tanto na concepção do Filho de Deus quanto em seu nascimento. Estamos certos de que o Anjo disse a verdade quando, tendo anunciado a Maria o mistério da Encarnação, precisou: o Espírito Santo descerá sobre vós e o poder do Altíssimo vos cobrirá com Sua sombra. Eis porque o santo que nascerá de vós será chamado Filho de Deus.
Em nome de sua pureza incomparável, que Maria sempre Virgem nos obtenha praticar a pureza, trazer e glorificar a Deus em nossos corpos (I Cor. VI, 20).
II. Visitação. A visita de Maria a sua prima santificou o Precursor no seio da sua mãe. Quando a Saudação da Virgem, Mãe de Deus, chegou aos ouvidos de Santa Isabel, a criança que ela levava estremeceu de alegria e foi purificada.
Quanto a nós, apesar de livres do pecado original desde o batismo, sofremos ainda as conseqüências de seus ferimentos. Que Maria se digne nos visitar e nos curar. Que ela obtenha, de modo particular, que nossa carne e nossa sensibilidade estejam em harmonia com a lei da graça.
III. Nascimento de Jesus. Com toda a Igreja cremos que Nossa Senhora, virgem na concepção, permaneceu virgem no nascimento do Menino Jesus. O milagre do nascimento virginal, que consagra a integridade de Maria, longe de feri-la, nos faz compreender bem que o Verbo de Deus se encarnou para restabelecer a integridade de nossa natureza corrompida pelo pecado.
Que Nossa Senhora, em nome de sua virgindade perpétua, se digne obter aos seres feridos que somos, a firme perseverança na virtude da pureza.
IV. Apresentação de Jesus no Templo e Purificação da Santa Virgem. Para honrar a lei de Moisés e instruir os fiéis, Jesus foi oferecido no Templo e a Virgem doou duas pequenas pombas para Sua purificação. No entanto, a lei de apresentação no Templo não tinha nada de obrigatório para Jesus, porque Ele se ofereceu em holocausto ao Pai desde o primeiro instante de Sua vida terrestre; a lei de purificação também não podia obrigar Maria, porque Ela é imaculada, sempre virgem, belíssima e puríssima. Por outro lado, a obrigação de ser purificado pertence a cada um de nós, pobres pecadores.
À vista de todas as nossas misérias, não queremos tão pouco perder a coragem. Voltamo-nos para vós, Virgem puríssima, com a firme confiança de obter de vós, em todos os domínios, uma pureza completa. Inviolata, intacta et casta es Maria... Suscipe pia laudum proeconia nostra ut pura pectora sint et corpora.
V. Encontro de Jesus no Templo e vida oculta. Um lar onde só se vê piedade e caridade, paz e doçura, trabalho simples, paciência e pureza; assim é o lar de Nazaré. Não se passou dia ou noite em que a vida da santa família não tivesse sido infinitamente agradável à Santíssima Trindade. Não podia deixar de ser assim no lar de Jesus, Verbo Encarnado, de Maria Mãe de Deus, de São José, casto guardião da Virgem.
Que Nossa Senhora de Nazaré derrame sobre nós as graças superabundantes que esse mistério da vida oculta nos mereceu. De modo particular a graça do recolhimento, da paciência e de uma total pureza interior.
I. Agonia no Jardim das Oliveiras. Em sua dolorosíssima agonia, Jesus se volta principalmente para Seu Pai, rezando de toda alma, consentindo em beber o cálice que Ele lhe deu. Ele se volta para seus três Apóstolos pedindo-lhes que velassem com Ele e advertindo-lhes sobre sua própria fragilidade: Velai e orai para não sucumbir à tentação, porque o espírito está pronto, mas a carne é fraca.
Dignai-vos conseguir, Virgem Maria, que tomemos para nós esse aviso. Preservai-nos de jamais presumir de nossas forças. Ensinai-nos o segredo de uma oração humilde, amorosa e incessante.
II. Flagelação. Cremos que é uma Pessoa divina que sofre em Sua natureza humana o tormento terrível dessa flagelação. Por conseguinte, os méritos desses sofrimentos têm um preço infinito. Os méritos do Redentor são suficientes para nos fazer vencer qualquer tentação.
Virgem Maria, obtende-nos de vosso Filho, em nome dos méritos de sua Paixão, a graça de toda pureza.
III. Coroação de Espinhos. Adorando Jesus que se deixa coroar de espinhos sem dizer nenhuma palavra, podemos entrever quanto é verdade que Ele seja manso e humilde de coração.
Virgem Maria, obtende-nos de vosso Filho coroado de espinhos a graça da doçura e da humildade.
IV. Carregamento da Cruz. Caminho de Cruz. Jesus percorreu o caminho de cruz até o cume do Calvário. Apesar do cansaço físico esmagador, nunca a falta de coragem encontrou um mínimo lugar em Sua alma santíssima.
Virgem Maria, em nome do caminho de cruz que vós subistes com o vosso Filho, obtende-nos jamais nos desencorajar qualquer que seja a distância da estrada a percorrer, ou os escândalos que tenhamos que suportar.
Virgem Maria, saúde dos enfermos, consoladora dos aflitos, intercedei pelos doentes e por todos os infelizes.
V. Morte sobre a cruz Sacrifício redentor. Mortem nostram moriendo destruxit. Morrendo por nós Ele destruiu nossa morte (Prefácio da Páscoa). A morte de Jesus reduziu ao nada tudo que pode fazer morrer nossa alma, esperando o feliz dia em que a morte corporal também será reduzida ao nada. Essa virtude vivificante da morte do Cristo se faz presente para nós em cada Missa.
Virgem Maria, preparai nossas almas para recolher piedosamente, sem desperdiçar nada, os benefícios infinitos do Sacrifício de Jesus. Obtende-nos ser testemunhas fiéis da Santa Missa.
GLORIFICAÇÃO DE JESUS E DE MARIA
MEDIAÇÃO UNIVERSAL DE MARIA
I. Ressureição. Et vitam resurgendo reparavit (Prefácio da Páscoa). Ressuscitando, Jesus restaurou nossa vida. Ainda que tenhamos que combater os atrativos do pecado ou os escândalos do mundo, a vitória está garantida, pois o Cristo é o vencedor.
Virgem Maria, obtende-nos crer firmemente na vitória de vosso Filho, de modo que a necessidade cotidiana de combater a nós mesmos, resistir e mortificar-nos não chegue a nos desencorajar. Obtende-nos, ao contrário, travar o combate com um coração alerto e intrépido. Apesar de nossa fraqueza e nossos pecados; estamos seguros, por vossa intercessão, de somos vitoriosos em Jesus Cristo.
II. Ascensão. Virgem Maria, obtende-nos uma caridade fervente, de modo a experimentarmos em alguma medida as alegrias celestes a que vosso Filho nos atrai por sua Ascensão. Que o gosto das coisas celestes seja suficientemente vivo para que os atrativos do mundo não tenham mais ação sobre nós.
III. Pentecostes. Todos os santos experimentam os frutos do Espírito Santo, radicalmente opostos aos frutos da carne. São Paulo nos falou desses frutos divinos, porque somos expressamente chamados a provar seu misterioso sabor.
Virgem Maria, por vossa intercessão no Cenáculo, merecestes que o Paráclito fosse enviado aos Apóstolos, às santas mulheres, a toda Igreja. Obtende-nos então uma grande efusão das graças do Paráclito; disponde-nos a conhecer por experiência própria todos esses frutos enumerados pelo Apóstolo: caridade, alegria e paz: paciência, afabilidade e bondade; longanimidade e doçura; fé e modéstia; continência e castidade (Gal, V, 23-25).
IV. Assunção. O santíssimo corpo de Maria, Mãe de Deus, imaculada, sempre Virgem, não conheceu a corrupção do túmulo. Nossa Senhora, assim que terminou o curso de sua vida terrestre, foi elevada ao céu e glorificada em seu corpo. Basta-nos elevar os olhos para a Rainha do céu, resplandecente na glória de seu Filho, para estarmos certos de que a graça vencerá o demônio e a morte. Que Nossa Senhora nos obtenha então perseverar com uma coragem invencível e vencer em nome de Jesus Cristo.
V. Coroação no céu e Realeza de Maria. Como relembram especialmente as festas do Santo Rosário e do Santíssimo Nome de Maria, temos provas palpáveis de que a Santa Virgem, Rainha do Céu e da terra, intervém milagrosamente na vida da Igreja para repelir as forças do Inferno.
Que agora a Virgem poderosa queira intervir mais vigorosamente do que nunca. Que Ela nos obtenha também a vitória em nossas lutas diárias, pois temos que lutar não somente contra a carne e o sangue, mas contra os espíritos maus, contra a malícia e os embustes do demônio (Ef. VI, 12).
Na ladainha invocamos a Santa Virgem lembrando cinco de suas prerrogativas que, aliás, se completam; invocamo-la como mãe, como virgem, a obra-prima de Deus designada em figuras e símbolos, o socorro nas aflições de qualquer tipo e enfim, a rainha por excelência.
Alguns dos títulos requerem uma palavra de esclarecimento. Espelho de Justiça. O termo justiça sendo tomado no sentido bíblico de santidade, diz-se da Virgem espelho de justiça porque ela é o reflexo sem mancha da santidade de Deus. O termo vaso, que é retomado três vezes, é igualmente empregado no sentido bíblico. Nesse caso, parece legítimo compreendê-lo como: ser, criatura. Maria é o vaso espiritual porque ela é criatura, a única criatura humana, que desde sempre e no próprio instante de sua concepção imaculada, foi a residência do Espírito Santo. Ela é o vaso honorífico no sentido de que é digna de honra mais que todas as outras criaturas do céu e da terra. Enfim, como Ela nunca deixou de ser devota aos desígnios de Deus – a Seus desígnios mais alto que é a encarnação redentora – reconhecemos que Ela é animada pela devoção mais insigne: eis a serva do Senhor. Ninguém ignora que a rosa é símbolo de amor; como Maria é cheia de graça e de amor, nós a proclamamos rosa mística. Maria nos protege com a força e inteligência de uma mãe contra a Serpente infernal e seus sequazes; podemos então compará-la a uma torre. Maria nos protege mais seguramente de todos os atrativos do pecado porque ela própria nunca deu ao pecado a menor chance; ela é puríssima; o brilho do marfim pode nos sugerir, mas de um modo deficiente, sua pureza imaculada. Em todo caso, na intervenção de Maria, pureza e proteção vão sempre juntas; ela é a torre de marfim. Maria em seu seio virginal deu um corpo humano ao Filho de Deus; ela é comparável a uma casa de beleza inestimável: casa de ouro. A arca da aliança continha somente as Tábuas da Lei. Mas Maria conteve Aquele que o céu e a terra não podem conter.
Maria está muito mais próxima de Deus do que o mais sublime dos anjos, pois Ela é a Mãe de Deus. Ela está muito mais perto de Deus e de uma outra maneira, tendo dado seu corpo ao Filho de Deus. Ela é então muito mais elevada do que os anjos; Ela tem autoridade sobre eles, que ficam encantados por serem súditos de seu império e fazem de executar suas ordens um ponto de honra. Ela é verdadeiramente Rainha dos Anjos. Os Patriarcas e os Profetas que esperavam e anunciavam o Messias, o Redentor da humanidade culpável, deviam também inevitavelmente, elevar os olhos para a Mãe do Messias, a Virgem que devia dar à luz, a mulher entre todas as outras bendita, que esmagaria por fim a cabeça da Serpente. Essa espera, que se prolongava pelos séculos e séculos, tinha começado no coração de Adão e Eva, os pais do gênero humano, logo depois do primeiro pecado, com o primeiro perdão do Pai celeste. A espera, a esperança, o anúncio profético então se tornaram precisos ao longo do Antigo Testamento. E os Patriarcas e Profetas anunciavam ao mesmo tempo que o Redentor e o Rei dos reis, a Virgem santíssima que devia colocá-lo no mundo e que reinaria à sua direita (Salmo 44... astitit Regina a dextris tuis). Maria é invocada, com plena exatidão, como Rainha dos Patriarcas e dos Profetas.
Ela então veio. Na véspera do dia em que ia começar a plenitude dos tempos, na primeira aurora que precederia imediatamente o dia de nossa libertação, eis que na vara de Jessé, uma flor se abre. Enfim aparece nesse mundo a pequena menina que os Patriarcas e os Profetas tinham esperado tanto, a filha de Ana e de Joaquim, de Adão e Eva, que não tinha nenhum traço do pecado dos primeiros pais. Ela veio cheia de graça e de santidade, mais santa do que jamais será nenhum dos santos da Santa Igreja. Ela está numa linha de santidade reservada somente a Ela: a santidade da mulher bendita que deveria dar a uma Pessoa divina sua natureza humana; a santidade daquela que, dizendo a Deus meu filho em toda propriedade do termo, é introduzida, por aí mesmo, na intimidade da Trindade, muito mais profundamente do que qualquer outra criatura. Situada numa linha de santidade absolutamente própria e reservada, porque está próxima do Redentor a ponto de ser sua Mãe, é inevitável que Ela possua em superabundância a graça e a caridade que fazem os outros santos. Sua excelência em relação a eles é coisa necessária. Ela penetrou os segredos do Evangelho, ela meditou-os em seu coração com mais fervor e inteligência do que os Apóstolos e evangelistas; eis porque sem ter pregado o Evangelho ela é Rainha dos Apóstolos. Sua união à dolorosíssima Paixão de Jesus foi mais dilacerante do que os suplícios dos maiores mártires; ela é então a Rainha dos Mártires. Sem ter celebrado os santos mistérios nem confessado a fé do modo ordinário dos confessores, ela deu testemunho dessa fé na presença de Deus, dos anjos e dos homens com a força e constância da santa Mãe de Deus; é então inteiramente justo aclamá-la como Rainha dos Confessores. Enfim sua virgindade foi de tal modo humilde, transparente, penetrada de caridade para com Deus, que Ela mereceu tornar-se Mãe de Deus permanecendo virgem; o Verbo de Deus devia de alguma forma consagrar a virgindade daquela que lhe dava sua natureza humana; verdadeiramente Rainha das Virgens... Rainha de todos os santos.
Kyrie, eleison Senhor, tende piedade de nós.
Christe, eleison Jesus Cristo, tende piedade de nós.
Kyrie, eleison Senhor, tende piedade de nós.
Christe, audi nos Jesus Cristo, ouvi-nos.
Christe, exaudi nos Jesus Cristo, atendei-nos.
Revista Permanência, Julho-Agosto de 1984 n° 188-189.