PASCENDI DOMINICI GREGIS (cont.)
III
ª PARTE
Remédios
A esta torrente de gravíssimos
erros, que às claras e às ocultas se vai avolumando, o Nosso Predecessor Leão
XIII, de feliz memória, procurou energicamente
levantar um dique, principalmente no que se refere às Sagradas
Escrituras. Já vimos, porém, que os modernistas não se deixam facilmente
intimidar; eis porque, aparentando o maior acatamento e a mais apurada
humildade, inverteram as palavras do Pontífice do modo que lhes convinha, e propalaram que os atos do mesmo eram
dirigidos a outros. Destarte o mal, dia a dia, foi tomando maiores proporções.
É por isto, Veneráveis Irmãos,
que decidimos lançar mãos, sem demora, de medidas mais enérgicas. Nós, porém,
vos pedimos e suplicamos que em negócio de tal monta nada, de modo algum, se
deixe a desejar em vossa vigilância,
desvelo e fortaleza. E isto mesmo que vos pedimos e de vós esperamos, pedimo-lo
também e esperamo-lo dos demais pastores das almas, dos educadores e mestres do
jovem clero, e particularmente dos Superiores gerais das Ordens religiosas.
I. No que se refere aos estudos,
queremos em primeiro lugar e mandamos terminantemente, que a filosofia escolástica
seja tomada por base dos estudos sacros. Bem se compreende que «se
os doutores escolásticos trataram certas questões com excessiva argúcia, ou
foram omissas noutras; se disseram coisas que mal se acomodam com as doutrinas
apuradas nos séculos posteriores, ou mesmo alguma coisa inadmissível, mui
longe está de nossa intenção querer que tudo isto deva servir de exemplo a
imitar nos nossos dias (Leão XIII, Enc.Aeterni Patris). O que
importa saber, antes de tudo, é que a filosofia escolástica, que mandamos
adotar, é principalmente a de Santo Tomás de Aquino; a cujo respeito queremos
fique em pleno vigor tudo o que foi determinado pelo Nosso Predecessor e, se há
mister, renovamos, confirmamos e mandamos severamente sejam por todos observadas
aquelas disposições. Se isto tiver sido descuidado nos seminários, insistam e
exijam os Bispos que para o futuro se observe. Tornamos extensiva a mesma ordem
aos Superiores das Ordens religiosas. E todos aqueles que ensinam fiquem cientes
de que não será sem graves prejuízos que especialmente em matérias metafísicas,
se afastarão de Santo Tomás. Fundamentada assim a filosofia, sobre ela se erga
com a maior diligência o edifício teológico. Veneráveis Irmãos, promovei
com toda a solicitude o estudo da teologia, de tal sorte que ao saírem dos
seminários os clérigos lhe tenham alta consideração e profundo amor, e
sempre o conservem carinhosamente. Porquanto é
de todos sabido que na quase infinitude das disciplinas que se apresentam às
inteligências ávidas do saber, é tão certo que à teologia cabe o primeiro
lugar, que os antigos diziam que era dever das outras ciências e artes
servirem-na e auxiliarem-na como escravas (Leão XIII, carta ap. In
magna, 10/12/1889). Aproveitamos esta ocasião para dizer que Nos
parecem dignos de louvor aqueles que, salvando o respeito devido à Tradição,
aos Santos Padres, ao magistério eclesiástico, procuram esclarecer a teologia
positiva com prudente critério e normas católicas (coisa que nem sempre se
observa), tirando luzes da verdadeira história. Certo é que na atualidade, à teologia positiva se deve dar maior extensão que outrora; entretanto, isto se
deve fazer de tal sorte que não seja de nenhum modo em detrimento da teologia
escolástica, e sejam censurados como fautores do modernismo, aqueles que de tal
modo elevam a teologia positiva que parece quase desprezarem a escolástica.
Quanto às disciplinas profanas,
basta lembrar o que sabiamente disse o Nosso Predecessor (Alloc. De 7/03/1880): «Aplicai-vos diligentemente ao
estudo das coisas naturais; pois, assim como em nossos dias as engenhosas
descobertas e os úteis empreendimentos com sobeja razão são admirados pelos
contemporâneos, da mesma sorte serão alvo de perenes louvores e encarecimentos
dos vindouros». Seja isto feito sem prejuízo dos estudos sacros; assim também
o advertiu o mesmo Nosso Predecessor, pela seguintes palavras
(lugar
citado): «A
causa de tais erros, se a investigarmos cuidadosamente, provém principalmente
de que hoje, quanto maior intensidade se dá aos estudos das ciências naturais,
tanto mais se descuram as disciplinas mais severas e mais elevadas; algumas
destas são, de fato, quase atiradas ao esquecimento; outras são tratadas com
pouca vontade e de leve, e, coisa indigna, perdido o esplendor de sua primitiva
dignidade, são deturpadas por opiniões inverossímeis e por enormes erros.
É esta a lei à qual mandamos que se conformem os estudos das
ciências naturais nos seminários.
II. Em vista tanto destas Nossas
disposições como da do Nosso Antecessor, convém prestar muita atenção toda vez que se tratar da escolha dos diretores e professores tanto dos seminários
quanto das Universidades católicas. Todo aquele que tiver tendências
modernistas, seja ele quem for, deve ser afastado quer dos cargos quer do magistério;
e se já tiver de posse, cumpre ser removido. Faça-se o mesmo com aqueles que,
às ocultas ou às claras, favorecerem o modernismo, louvando os modernistas, ou
atenuando-lhes a culpa, ou criticando a escolástica, os Santos Padres, o magistério
eclesiástico, ou negando obediência a quem quer que se ache em exercício do
poder eclesiástico; bem assim como aqueles que se mostrarem amigos da novidade
em matéria histórica, arqueológica e bíblica; e finalmente com aqueles que
se descuidarem dos estudos sacros ou parecerem dar preferência aos profanos. Neste ponto, Veneráveis Irmãos, e particularmente na escolha dos lentes, nunca
será demasiada a vossa solicitude e constância; porquanto, é o mais das vezes
ao exemplo dos mestres que se formam os discípulos. Firmados, portanto, no
dever da consciência, procedei nesta matéria com prudência, mas também com
energia.
Não deve ser menor a
vossa vigilância e severidade na
escolha daqueles que devem ser admitidos ao Sacerdócio. Longe, muito longe do
clero esteja o amor às novidades; Deus não vê com bons olhos os ânimos
soberbos e rebeldes! A ninguém doravante se conceda a láurea da teologia ou
direito canônico, se primeiro não tiver feito todo o curso de filosofia escolástica.
Se, não obstante isto, ela for concedida, será nula. Tornem-se doravante
extensivas a todas as nações as disposições emanadas da Sagrada Congregação
dos Bispos e Regulares no ano 1896, acerca da freqüência dos clérigos
regulares e seculares da Itália às Universidades. Os clérigos e sacerdotes
inscritos a um Instituto ou a uma Universidade católica, não poderão freqüentar
nas Universidades civis cursos também existentes nos Institutos católicos a
que se inscreveram. Se, em tempos passados, isto tiver sido concedido em algum
lugar, mandamos que de ora em diante não mais se permita. Ponham os Bispos que
formam o conselho diretivo de tais Institutos católicos ou Universidades católicas,
o maior empenho em fazer observar estas nossas determinações.
III. Compete, outrossim, aos
Bispos providenciar para que os livros dos modernistas já publicados não sejam
lidos, e as novas publicações sejam proibidas. Qualquer livro, jornal ou
periódico desse gênero não poderá ser permitido aos alunos dos seminários
ou das Universidades católicas, pois daí não lhes proviria menor mal do que
o que produzem as más leituras; antes, seria ainda pior, porque ficaria
contaminada a mesma raiz da vida cristã. Nem diversamente se há de julgar
dos escritos de certos católicos, homens aliás de não más intenções, porém
faltos de estudos teológicos e embebidos de filosofia moderna, que procuram
conciliar com a fé, e fazê-la servir, como eles dizem, em proveito da mesma fé.
O nome e a boa reputação dos autores faz com que tais livros sejam lidos sem o
menor escrúpulo, e por isto mesmo se tornam assaz perigosos para pouco e pouco
encaminharem ao modernismo.
Querendo, Veneráveis Irmãos,
dar-vos normas gerais em tão grave assunto, se em vossas dioceses circularem
livros perniciosos, procurai energicamente proscrevê-los, condenando-os mesmo
solenemente, se o julgardes oportuno. Conquanto esta Sede Apostólica procure
por todos os meios proscrever tais publicações, tornou-se hoje tão avultado o
seu número que não lhe bastariam forças para condená-las todas. Disto
resulta às vezes que o remédio já chega tarde, porque a demora já facilitou
a infiltração do mal. Queremos, por conseguinte, que os Bispos, pondo de parte
todo o receio, repelindo a prudência da carne, desdenhando a grita dos maus,
com suavidade perseverante cumpram todos o que lhes cabe, lembrando-se do que na
Constituição Apostólica Officiorum, Leão
XIII escreveu: «Empenhem-se os Ordinários,
mesmo como Delegados da Sede Apostólica, em proscrever e tirar das mãos dos fiéis
os livros ou quaisquer escritos nocivos publicados ou divulgados nas suas
dioceses». Com estas palavras,
é verdade, concede-se um direito; mas, ao mesmo tempo, também se impõe um
dever. Ninguém, contudo, julgue ter cumprido tal dever pelo fato de Nos remeter
um ou outro livro, deixando entretanto muitíssimos outros serem publicados e
divulgados. Nem se julguem desobrigados disto por terem ciência de que
certo livro alcançou de outrem o Imprimatur,
porquanto tal concessão pode ser falsa, como também pode ter sido por
descuido, por excesso de benignidade, ou por demasiada fé no autor; e este último
caso pode muito facilmente dar-se nas Ordens religiosas. Acresce também saber
que, assim como todo e qualquer alimento não serve igualmente para todos, da
mesma sorte um livro que pode ser inocente num lugar, já noutro, por certas
circunstâncias, pode tornar-se nocivo. Se, por conseguinte, o Bispo, depois de
ouvir o parecer de pessoas prudentes, julgar que em sua diocese deve ser
condenado algum desses livros, damos-lhe para isto ampla faculdade, e até o
oneramos com este dever. Desejamos entretanto se conservem as devidas atenções,
e talvez baste num ou noutro caso restringir ao clero essa proibição; e ainda
mesmo neste caso os livreiros católicos estão obrigados a não dar à venda as
publicações proibidas pelo Bispo. E já que nos caiu sob a pena este
assunto, atendam os Bispos a que os livreiros, por avidez de lucro, não vendam
livros perniciosos; o certo é que nos catálogos de alguns deles não poucas
vezes se vêem anunciados, e com bastante louvores, os livros dos modernistas.
Se eles a isto se recusarem, não ponham dúvida os Bispos em privá-los do título
de livreiros católicos; da mesma sorte, e por mais forte razão, se gozarem do
título de episcopais; mas, se tiverem o título de pontifícios, seja o caso
deferido à Santa Sé. A todos finalmente lembramos o artigo XXVI da citada
Constituição apostólica Officiorum: «Todas as pessoas que tiverem obtido faculdade apostólica de ler e conservar
livros proibidos, não se acham por esse mesmo fato autorizadas a ler livros ou
jornais proscritos pelos Ordinários locais, salvo se no indulto apostólico se
achar expressamente declarada a licença de ler e conservar livros condenados
por quem quer seja».
IV. No entanto não basta impedir
a leitura ou a venda de livros maus; cumpre, outrossim, impedir-lhes a impressão.
Usem pois, os Bispos a maior severidade em conceder licença para impressão. E visto como é grande o número de livros que, segundo a Constituição Officiorum,
hão mister da autorização do Ordinário, é costume em certas dioceses
designar, em número conveniente, Censores, por ofício, para o exame dos
manuscritos. Louvamos com efusão de ânimo essa instituição de censura; e não
só exortamos, mas mandamos que se estenda a todas as dioceses. Haja, portanto,
em todas as Cúrias episcopais censores para a revisão dos escritos em via de
publicação. Sejam estes escolhidos no clero secular e regular, homens idosos,
sábios e prudentes, que ao aprovar ou reprovar uma doutrina tomem um meio termo
seguro. Terão eles o encargo de examinar tudo o que, segundo os artigos XLI e
XLII da referida Constituição, precisar de licença para ser publicado. O
Censor dará o seu parecer por escrito. Se for favorável, o Bispo permitirá a
impressão com a palavra Imprimatur, que
deverá ser precedida do Nihil obstat
e do nome do Censor. Também na Cúria romana, como nas outras, serão
estabelecidos Censores de Ofício. Serão estes designados pelo Mestre do Sagrado Palácio Apostólico, depois de consultar o Cardeal Vigário de Roma e
obtido também o consentimento e aprovação do Sumo Pontífice. O mesmo
determinará qual dos Censores deverá examinar cada escrito. A licença de
impressão será concedida pelo referido Mestre juntamente com o Cardeal Vigário
ou o seu Vice-gerente, antepondo-se, porém, como acima se disse, o Nihil
obstat e o nome do Censor. Somente em circunstâncias extraordinárias e
raríssimas, a prudente juízo do Bispo, poderá omitir-se a menção do Censor.
Nunca se dará a conhecer ao autor o nome do Censor, antes que este tenha
dado seu juízo favorável, afim de que o Censor não venha sofrer vexames,
enquanto examinar os escritos ou depois que os tiver desaprovado. Nunca se
escolham Censores entre as Ordens religiosas, sem primeiro pedir secretamente o
parecer ao Superior provincial, ou, se se tratar de Roma, ao Geral; estes deverão
em consciência dar atestado dos costumes, do saber, da integridade e das
doutrinas do escolhido. Avisamos aos Superiores religiosos do gravíssimo
dever que têm de nunca permitir que algum de seus súditos publique alguma
coisa, sem a prévia autorização juntamente com a do Ordinário. Declaramos em último lugar, que o título de Censor, com que alguém for
honrado, nenhuma eficácia terá nem jamais poderá ser aduzido para corroborar
as suas opiniões particulares.
Ditas estas coisas em geral,
particularmente mandamos a mais rigorosa observância do que se prescreve no
artigo XLII da citada Constituição Officiorum,
a saber: «É proibido aos sacerdotes
seculares tomarem a direção de jornais ou periódicos, sem prévia autorização
do Ordinário». Será privado desta licença quem, depois de ter recebido
advertência, continuar a fazer mau uso dela. Como há certos sacerdotes,
que, com o nome de correspondentes, ou colaboradores,
escrevem nos jornais ou periódicos, artigos infectos de modernismo, tomem providências
os Bispos para que tal não aconteça; e, acontecendo, advirtam-nos e proíbam-nos
de escrever. Com toda a autoridade
mandamos que os Superiores das Ordens religiosas façam o mesmo; e se estes se
mostrarem descuidados neste ponto, façam-no os Bispos com autoridade delegada
do Sumo Pontífice. Sempre que for possível tenham os jornais e periódicos
publicados pelos católicos um determinado Censor. Será este obrigado à revisão
de todas as folhas ou fascículos já impressos; e se encontrar alguma coisa
perigosa, fará corrigi-la quanto antes.
V. Já nos referimos acima aos
congressos, reuniões públicas, em que os modernistas se aplicam à pública
defesa e propaganda das suas opiniões. Salvo raríssimas exceções, de ora
em diante os Bispos não permitirão mais os congressos de sacerdotes. Se nalgum
caso o permitirem, será sob condição de não tratarem de assuntos de competência
dos Bispos ou da Santa Sé, de não fazerem propostas nem petições que
envolvam usurpação de jurisdição, nem se faça menção alguma de tudo o que
pareça modernismo, presbiterianismo ou
laicismo. A essas reuniões que
devem ser autorizadas, cada uma em particular e por escrito, e na época
oportuna, não poderá comparecer sacerdote algum de outra diocese, sem as
cartas de recomendação do próprio Bispo. Lembrem-se todos os sacerdotes do
que por estas gravíssimas
palavras, Leão XIII recomendou (Carta Enc. Nobilissima Gallorum 10/02/1884):
«Seja intangível para os
sacerdotes a autoridade dos próprios Bispos; persuadem-se de que se o ministério
sacerdotal não se exercer debaixo da direção do Bispo, não será santo, nem
proveitoso nem merecedor de respeito».
VI. Mas que aproveitariam, Veneráveis
Irmãos, as Nossas ordens e as Nossas prescrições, se não fossem observadas
como se deve com firmeza? Para o alcançarmos, pareceu-Nos
bem estender a todas as dioceses o que
desde muito anos os Bispos da Úmbria, com tanta sabedoria, resolveram entre si
(Atas do Congresso dos Bispos de Úmbria, nov.1849, Tit.II art.6). «Para
extirpar, diziam eles, os erros já
espalhados e impedir que se continue a sua difusão, ou que haja mestres de
impiedade que perpetuam os perniciosos efeitos produzidos por essa mesma difusão,
seguindo o exemplo de São Carlos Borromeu, este sacro Congresso determina que
em cada diocese se institua um conselho de homens eméritos dos dois cleros, com
a incumbência de ver se, e de que modo, os novos erros se dilatam e se propagam,
e dar aviso disto ao Bispo, para que de comum acordo se providencie para a extinção
do mal logo que desponte e não tenha tempo de espalhar-se com detrimento das
almas, nem, o que ainda seria pior, de se avigorar e crescer. Determinamos,
pois, que em cada diocese se institua um semelhante Conselho, que se denominará
Conselho de Vigilância. Os membros do Conselho serão escolhidos pela normas já
prescritas para os Censores dos livros. Reunir-se-ão de dois em dois meses, em
dia determinado, em presença do Bispo; e as coisas tratadas ou resolvidas
guardem-nas os Conselheiros com segredo inviolável.
Serão estes os deveres dos
membros do Conselho: investiguem com cuidado os vestígios do modernismo, tanto
nos livros como no magistério, e com prudência, rapidez e eficácia
providenciem quando houver mister pela preservação do clero e da mocidade. –
Combatam as novidades de palavras, e lembrem-se dos avisos de Leão XIII (Instr.
S.C. NN. EE. EE. 27/01/1902): «Nas
publicações católicas não se poderia aprovar uma linguagem que,
inspirando-se em perniciosas novidades, parecesse escarnecer da piedade dos fiéis
e falasse de nova orientação da vida cristã, de novas direções da Igreja,
de novas aspirações da alma moderna, de nova vocação do clero, de nova
civilização cristã». Não se
tolerem tais dislates nem nos livros nem nas cátedras. – Não se descuidem
dos livros em que se tratar das piedosas tradições de cada lugar, ou das
sagradas Relíquias. Não permitam que se ventilem tais questões em jornais ou
em periódicos destinados a nutrir a piedade, nem com expressões que tenham
ares de zombaria ou de desdém, nem com afirmações decisivas, particularmente,
como quase sempre sucede, quando o que se afirma não passa as raias da
probabilidade ou quando se baseia em opiniões e preconceitos. – Acerca das
sagradas Relíquias tomem-se as seguintes normas: se os Bispos, que são os únicos
juízes nesta matéria, reconhecerem com certeza que uma relíquia é falsa, sem
demora a subtrairão ao culto dos fiéis. Se, por ocasião de perturbações
civis ou por outro motivo, se tiverem extraviado os documentos de autenticidade
de uma Relíquia qualquer, não seja exposta à veneração do povo, sem que
primeiro tenha sido reconhecida pelo Bispo. Só terá valor o argumento de
prescrição ou de presunção fundada, quando o culto for recomendável pela
sua antigüidade, conforme o Decreto da Congregação das Indulgências e das
sagradas Relíquias, do ano de 1896, expresso nestes termos: «As
antigas Relíquias devem ser conservadas na veneração que tiverem até agora,
salvo se em casos particulares se tiverem provas certas de que são falsas ou
supositícias. – Nos juízos a emitir acerca das pias tradições,
tenha-se sempre diante dos olhos a suma prudência de que usa a Igreja nesta matéria,
de não permitir que essas tradições sejam relatadas nos livros sem as
determinadas precauções, e com a prévia declaração prescrita por Urbano
VIII; e apesar disto, ainda não se segue que a Igreja tenha o fato por
verdadeiro, mas apenas não proíbe que se lhe dê crédito, uma vez que para
isto não faltem argumentos humanos. Foi isto precisamente o que, há trinta
anos, a Sagrada Congregação dos Ritos declarou (Decr. 2/05/1877): «Essas
aparições ou revelações não foram aprovadas nem condenadas pela Santa Sé,
foram apenas aceitas como merecedores de piedosa crença, com fé puramente
humana, em vista da tradição de que gozam, também confirmadas por testemunhas
e documentos idôneos». Quem se apegar a esta regra, nada tem que temer. Com
efeito, o culto de qualquer aparição, enquanto se baseia num fato e por isto se
chama relativo, inclui sempre
implicitamente a condição de veracidade do fato; o absoluto,
porém, sempre se funda na verdade, porquanto se dirige às mesmas pessoas dos
Santos, a quem se honra. Dá-se o mesmo com as Relíquias. –Recomendamos por
fim ao Conselho de Vigilância, lance assídua e cuidadosamente as suas vistas
sobre os institutos sociais e bem assim sobre os escritos relativos a questões
sociais, afim de que nem sequer aí se dê agasalho a livros de modernismo, mas
se acatem as prescrições dos Pontífices Romanos.
VII. A fim de que as coisas aqui
determinadas não fiquem esquecidas, queremos e mandamos que, passado um ano da
publicação das presentes Letras, e em seguida, depois de cada triênio, com
exposição diligente e juramentada os Bispos informem a Santa Sé a respeito do
que nestas mesmas Letras se prescreve e das doutrinas que circulam no clero e
particularmente nos seminários e outros Institutos católicos, não excetuando
nem sequer aqueles que estão isentos da autoridade do Ordinário. Ordenamos a
mesma coisa aos Superiores gerais das Ordens religiosas, com relação aos seus
súditos.
Julgamos oportuno escrever-vos
estas coisas, Veneráveis Irmãos, a bem da salvação de todos os fiéis. Por
certo os inimigos da Igreja hão de valer-se disto, para de novo repisarem a
velha acusação, com que procuram fazer-Nos passar por inimigos da ciência e
dos progressos da civilização. A fim de opormos um novo desmentido a tais
acusações, que são desfeitas a cada página da história da Igreja, é Nosso
propósito conceder todo o auxílio
e proteção a uma nova Instituição, pela qual sob o influxo da verdade católica,
será promovida toda a sorte de ciências e erudições, com o concurso dos católicos
mais insignes no saber. Queira Deus secundar os Nossos desígnios, e
auxiliarem-nos todos quantos têm verdadeiro amor à Igreja de Jesus Cristo. –
Entretanto, Veneráveis Irmãos, para vós, em cuja obra e zelo tanto confiamos,
pedimos de coração a plenitude das luzes celestiais, afim de que, nesta época
de tão grande perigo para as almas, devido aos erros que de toda parte se
infiltram, descortineis o que deveis fazer e o executeis com todo o ardor e
fortaleza. Que vos assista com seu poder Jesus Cristo, autor e consumidor da fé;
que vos assista com o seu socorro a Virgem Imaculada, destruidora de todas as
heresias. E Nós, como penhor da Nossa afeição e como arras das divinas
consolações no meio de vossos trabalhos, de coração vos damos a vós, ao
vosso clero, e ao vosso povo a Benção Apostólica.
Dado em Roma, junto a São Pedro,
no dia 8 de setembro de 1907, no quinto ano do Nosso Pontificado.
PIO X, PAPA.
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